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editorial
. 2024 Feb 16;121(1):e20230808. [Article in Portuguese] doi: 10.36660/abc.20230808
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Eletrocardiograma na Avaliação Pré-Operatória do Paciente de Baixo Risco: Evidências Atuais

Francisco José de Oliveira Filho 1, Leonardo Rufino Garcia 1, Pedro Luciano Mellucci Filho 1, Lenize da Silva Rodrigues 1, Matheus Bertanha 1,
PMCID: PMC11081144  PMID: 38451564

As doenças cardiovasculares representam a principal causa de mortalidade da população adulta, tanto no Brasil quanto globalmente. A mortalidade proporcional por essas doenças no Brasil é de aproximadamente 27%.1 As alterações cardiovasculares se tornam objeto de enorme preocupação para os pacientes que serão submetidos a procedimentos cirúrgicos, momento em que o organismo é exposto a alto nível de estresse metabólico e, dessa forma, complicações cardiovasculares podem se sobrepor com desfechos desfavoráveis. No mundo, estima-se que anualmente cerca de 900 mil pacientes submetidos a cirurgias evoluam com complicações cardíacas relacionadas diretamente ao ato cirúrgico.2 Neste contexto, o período perioperatório e, portanto, as alterações fisiológicas secundárias ao trauma cirúrgico são, isoladamente, um fator de risco para a manifestação de doenças cardiovasculares.

No Brasil, são realizadas entre 2 e 3 milhões de cirurgias por ano de acordo com o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS).3 A grandeza dos números reitera a importância da realização de um preparo pré-operatório pormenorizado para que sejam minimizados os riscos relativos ao procedimento cirúrgico, incluindo a avaliação cardiológica.

Dentre os exames complementares para avaliação pré-operatória cardiovascular, o eletrocardiograma (ECG) apresenta características de destaque, principalmente por ser um exame simples, não invasivo, barato, facilmente disponível e com interpretação relativamente simples por profissionais treinados. Por essas razões, o ECG se torna um importante instrumento diagnóstico na detecção de condições cardiovasculares em desenvolvimento ou já instaladas. A relevância do ECG como exame pré-operatório é reconhecida em grandes diretrizes aplicadas mundialmente, como a classificação de risco cirúrgico da American Society of Anesthesiologists (ASA),4 a American College of Cardiology / American Heart Association (ACC/AHA)5 e o European Society of Cardiology (ESC).6

A relação entre achados do ECG e os eventos adversos perioperatórios é classicamente descrita, incluindo anormalidades no traçado que podem predizer complicações cardíacas como infarto agudo do miocárdio e arritmias, ajudando na adoção de estratégias preventivas perioperatórias como a possibilidade de intervenções coronarianas precoces, controle medicamentoso e evitando eventos mais graves durante a anestesia.7

Importante ressaltar que a relevância do ECG varia de acordo com o tipo de cirurgia a ser realizada. Em procedimentos cirúrgicos de grande porte, como cirurgias cardiovasculares e para pacientes de alto risco cardiovascular, o ECG desempenha um papel crítico na avaliação pré-operatória, pois essas cirurgias estão mais associadas a eventos cardíacos adversos.4-6

Entretanto, o consenso da European Society of Cardiology recomenda a dispensa do ECG na avaliação pré-operatória cardiovascular de pacientes com idade inferior a 65 anos, sem fatores de risco cardiovasculares e que serão submetidos a procedimentos de baixo risco.6,7 Evidências atuais demonstram que a realização do ECG pré-operatório, nessas condições, não tem influência em reduzir a mortalidade perioperatória, além de ocasionar um aumento ao custo total do tratamento, não de forma direta, mas como um efeito em cadeia da sua sobreutilização, o que se apresenta em acordo com artigo “Importância Prognóstica Do Eletrocardiograma Pré-Operatório Em Pacientes De Baixo Risco Submetidos À Intervenção Cirúrgica Sob Anestesia Geral” publicado nesta edição.8,9

Deve-se ressaltar que a avaliação médica perioperatória deve ser realizada de forma individualizada e minuciosa, incluindo anamnese e exame clínico completos, não dispensando a realização de diversos exames complementares. Por vezes, o ECG pré-operatório ainda pode servir como padrão de comparação na ocorrência de alterações de traçado no perioperatório, em situações nas quais não exista uma alteração eletrocardiográfica prévia. Deve-se lembrar, contudo, que existem alterações do ECG que nem sempre se correlacionam com alterações cardíacas estruturais, sendo muitas vezes benignas em alguns subgrupos de pacientes, como os bloqueios atrioventriculares de 1° grau, bloqueios de condução intraventricular, bloqueios de ramo direito e bloqueios da divisão anterossuperior do ramo esquerdo, o que pode reforçar as conclusões dos autores já citados.10

Finalmente, a medicina baseada em evidências deve ser um baluarte na tomada de decisão e, nesse sentido, estudos com populações específicas podem apresentar limitações quando se propõe a tentativa de extrapolação para populações gerais.6,9 Porém, podem indicar o começo para a mudança de alguns paradigmas.

Footnotes

Minieditorial referente ao artigo: Importância Prognóstica do Eletrocardiograma Pré-Operatório em Pacientes de Baixo Risco Submetidos à Intervenção Cirúrgica sob Anestesia Geral

Referências

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Arq Bras Cardiol. 2024 Feb 16;121(1):e20230808. [Article in English]

Electrocardiography in the Pre-Operative Assessment of Low-Risk Patients: Current Evidence

Francisco José de Oliveira Filho 1, Leonardo Rufino Garcia 1, Pedro Luciano Mellucci Filho 1, Lenize da Silva Rodrigues 1, Matheus Bertanha 1,

Cardiovascular diseases represent the main cause of mortality in the adult population, both in Brazil and globally. The proportional mortality from these diseases in Brazil is approximately 27%.1 Cardiovascular alterations become the cause of great concern for patients who will undergo surgical procedures, a time when the body is exposed to a high level of metabolic stress and, therefore, cardiovascular complications can overlap with unfavorable outcomes. Worldwide, it is estimated that annually, approximately 900,000 patients undergoing surgery develop cardiac complications directly related to the surgery.2 In this context, the perioperative period and, therefore, physiological changes secondary to surgical trauma are a more important risk factor for the manifestation of cardiovascular diseases.

In Brazil, between 2 and 3 million surgeries are performed per year, according to the Department of Informatics of the Unified Health System (DATASUS).3 The magnitude of the data reiterates the importance of carrying out detailed pre-operative preparation so that the risks related to the surgical procedure are minimized, including cardiological evaluation.

Among the complementary tests for pre-operative cardiovascular assessment, the electrocardiogram (ECG) has outstanding characteristics, mainly because it is a simple, non-invasive, inexpensive, easily available test with relatively simple interpretation by trained professionals. For these reasons, the ECG becomes an important diagnostic tool in detecting developing or already established cardiovascular conditions. The relevance of the ECG as a pre-operative exam is recognized in major guidelines applied worldwide, such as the surgical risk classification of the American Society of Anesthesiologists (ASA),4 the American College of Cardiology / American Heart Association (ACC/AHA)5 and the European Society of Cardiology (ESC).6

The relationship between ECG findings and perioperative adverse events is classically described, including abnormalities in the tracing that can predict cardiac complications such as acute myocardial infarction and arrhythmias, helping in the adoption of preventive perioperative strategies such as early coronary interventions, medication control, and avoiding more serious events during anesthesia.7

It is important to highlight that the relevance of the ECG varies according to the type of surgery to be performed. In major surgical procedures, such as cardiovascular surgeries and for patients at high cardiovascular risk, the ECG plays a critical role in the pre-operative assessment, as these surgeries are more frequently associated with adverse cardiac events.4-6

However, the consensus of the European Society of Cardiology recommends that ECG should not be used in the pre-operative cardiovascular assessment of patients under the age of 65, without cardiovascular risk factors, and who will undergo low-risk procedures.6,7 Current evidence demonstrates that performing a pre-operative ECG under these conditions does not influence reducing perioperative mortality, in addition to causing an increase in the total cost of treatment, not directly, but as a chain effect of its overutilization, which agrees with the article “Prognostic Importance of Pre-Operative Electrocardiogram in Low-Risk Patients Undergoing Surgical Intervention Under General Anesthesia” published in this journal.8,9

It should be noted that the pre-operative medical evaluation must be carried out in an individualized and meticulous manner, including a complete anamnesis and clinical examination, without excluding the need for various complementary exams. Sometimes, the pre-operative ECG can still serve as a standard parameter for comparison in the occurrence of perioperative tracing changes in situations in which there was no previous electrocardiographic change. It should be remembered, however, that there are ECG changes that do not always correlate with structural cardiac changes and are often benign in some subgroups of patients, such as 1st-degree atrioventricular blockages, intraventricular conduction blockages, right bundle branch block and block of the anterosuperior division of the left bundle branch, which may reinforce the conclusions of the authors previously mentioned.10

Finally, evidence-based medicine must be the foundation in decision-making, and, in this sense, studies with specific populations may present limitations when trying to extrapolate to general populations.6,9 However, they may indicate the beginning of some paradigm changes.

Footnotes

Short Editorial related to the article: Prognostic Value of Preoperative Electrocardiogram in Low-Risk Patients Undergoing Surgical Intervention and General Anesthesia


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