A história recente da taquicardia atrial para-Hissiana (TAPH) se parece muito com a história mais antiga da taquicardia de reentrada nodal atrioventricular (TRNAV). O debate sobre os limites anatômicos precisos da reentrada nodal atrioventricular continua hoje no que diz respeito à TRNAV,1 mesmo 75 anos após a primeira suspeita de que alguns mecanismos de taquicardia supraventricular poderiam envolver a região do nó atrioventricular.2 Nesse tipo de arritmia, o primeiro alvo para a terapia ablativa por cateter foi a via rápida do nó atrioventricular:3 essa abordagem apresentou alta taxa de sucesso, mas a indução do bloqueio atrioventricular foi encontrada em mais de um a cada cinco pacientes.4 Após alguns anos, foi proposta uma abordagem por via lenta,5 que se mostrou mais eficaz e segura do que a abordagem por via rápida.4 Por alguns anos, essa nova abordagem gerou algum debate na comunidade de eletrofisiologia. Alguns autores chegam a sugerir a substituição de uma técnica por outra, desde que a TRNAV persistisse.6 Atualmente, a abordagem pela via rápida foi definitivamente abandonada e, quando pensamos em ablação por cateter de TRNAV, pensamos apenas na ablação por via lenta.
A TAPH é um grupo de taquicardias atriais (ATs) com origem próxima à região do feixe de His. Sua prevalência é bastante elevada em algumas casuísticas,7 por isso é importante aprender a reconhecê-las e tratá-las. Hoje em dia, da mesma forma que a TRNAV, também para a TAPH existe um debate tanto sobre o sítio anatômico de origem desse tipo de arritmia,8 tanto sobre o mecanismo9 , 10 quanto sobre a melhor abordagem de ablação por cateter.11 - 14 Alguns autores sugerem a presença de um pequeno circuito reentrante adjacente ao anel tricúspide;10 outros descreveram a TAPH como ATs focais originando-se de vários pontos ao redor do anel tricúspide ou mitral.9 As TAPH são passíveis de ablação por cateter por várias abordagens, incluindo o septo interatrial direito, septo interatrial esquerdo por punção transeptal e seio não coronário (SNC) de Valsalva da raiz aórtica por abordagem transaórtica via artéria femoral.
Nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Chokr et al.15, é importante descrever uma série de casos de pacientes submetidos à ablação do seio de Valsalva. Um dos achados mais relevantes de seu trabalho foi que esse tipo de ablação é viável com uma exposição radiológica relativamente baixa, também sem um sistema de mapeamento eletroanatômico 3-D e sem a ecocardiografia intracardíaca, método que a comunidade de eletrofisiologia atual parece não conseguir deixar de fora. Por esse motivo, o método pode ser viável em todos os laboratórios de eletrofisiologia.
No entanto, mesmo que já tenha sido comprovado que uma abordagem ablativa do seio de Valsalva é mais eficaz e segura do que uma abordagem da região do feixe de His no septo interatrial direito e/ou esquerdo,12 , 14 independentemente do local de ativação atrial mais precoce, alguns autores sugerem como primeira escolha em algumas situações a ablação do septo interatrial direito ou esquerdo,11 , 13 apesar do risco de danos ao sistema de condução atrioventricular. Provavelmente, como na história do TRNAV, daqui a mais 25 anos, quando pensarmos em ablação para TAPH, pensaremos apenas na abordagem do seio de Valsalva, e a abordagem da região do feixe de His será definitivamente esquecida!
Footnotes
Minieditorial referente ao artigo: Ablação por Cateter de Taquicardia Atrial Focal com Ativação Precoce Próxima ao Feixe de His, a Partir da Cúspide Aórtica não Coronária
Referências
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