Skip to main content
Arquivos Brasileiros de Cardiologia logoLink to Arquivos Brasileiros de Cardiologia
. 2020 Oct 13;115(4):717–718. [Article in Portuguese] doi: 10.36660/abc.20190599
View full-text in English

Problemas Relacionados à Trombocitopenia em Pacientes com Fibrilação Atrial Concomitante que Necessitam de Prevenção Antitrombótica: Um Estudo de Coorte Retrospectivo

Renato De Vecchis 1,, Andrea Paccone 2, Silvia Soreca 1
PMCID: PMC8386965  PMID: 33111875

Resumo

Baixas doses de edoxabana e enoxaparina sódica foram objeto de uma comparação retrospectiva implementada com a técnica do escore de propensão a fim de mitigar os efeitos das diferenças nas características clínicas basais de duas coortes e minimizar o risco de viés.

Posteriormente, usando um modelo de riscos proporcionais de Cox, avaliou-se a associação de cada tipo de terapia com o risco do composto de morte por todas as causas, acidente vascular cerebral/ataque isquêmico transitório, hospitalizações e ocorrência de sangramentos maiores. Para essa análise, um valor de p < 0,05 foi considerado estatisticamente significante. A terapia com enoxaparina e cirrose hepática como causadora de trombocitopenia estiveram associadas ao aumento do risco do endpoint composto (enoxaparina: hazard ratio (HR): 3,31; IC 95%: 1,54 a 7,13; p = 0,0023; cirrose hepática, HR: 1,04; 95% CI: 1,002 a 1,089; p = 0,0410). Por outro lado, a terapia com edoxabana mostrou-se significativamente associada à diminuição do risco do endpoint composto (HR: 0,071; 95% CI: 0,013 a 0,373; p = 0,0019). Com base nessa análise retrospectiva, o edoxaban em doses baixas seria uma ferramenta farmacológica segura e eficaz para a profilaxia de eventos cardioembólicos em pacientes com FA e trombocitopenia.

Palavras-chave: Estudos de Coortes, Trombocitopenia, Fibrilação Atrial, Anticoagulantes, Edoxabana, Enoxaparina, Hemorragia, Acidente Vascular Cerebral, Cirrose Hepática Heparina/uso terapêutico

Introdução

Um problema comum é a presença de fibrilação atrial (FA) em pacientes que sofrem de trombocitopenia, o que obviamente contraindica a administração de fármacos anticoagulantes em dose completa.1 Além disso, nesses casos, a implementação de um programa de ablação de FA envolve risco não desprezível, visto que os três primeiros meses após a ablação, o chamado “período de supressão”, coincide com a necessidade de administrar, dado o alto risco de recidivas de FA, não apenas antiarrítmicos, mas também anticoagulantes em doses completas.2 Em vez disso, a administração de heparina fracionada de baixo peso molecular, ou seja, enoxaparina sódica3 na dose de 4000 UI por dia, surgiu como uma opção viável. Alternativamente, uma abordagem terapêutica amplamente praticada foi o antagonista da vitamina K edoxabana4 na dose prefixada de 30 mg por dia.

No presente estudo de coorte retrospectiva, que abrangeu um período mediano de 40 meses (intervalo interquartil: de 36 a 48 meses), 220 pacientes foram incluídos de acordo com um critério arbitrário, ou seja, sem realizar cálculos de potência e de tamanho amostral. No total, os pacientes submetidos a edoxabana foram 90, ao passo que 130 pacientes foram submetidos a enoxaparina.

Os requisitos para inclusão no estudo retrospectivo foram: trombocitopenia moderada, definida por uma concentração plaquetária entre 99.000 e 30.000 trombócitos por mm3; FA crônica, sujeita à estratégia de controle de taxas; ausência de FA paroxística recém-diagnosticada.

O recrutamento de casos se baseou na constituição de grupos homogêneos, de acordo com o método do escore de propensão de pareamento (propensity score matching)5 para diminuir o risco de viés resultante das diferenças nas características clínicas basais dos dois grupos. Os pacientes que estavam tomando heparina não fracionada foram pareados com uma dose baixa (30 mg por dia) de edoxabana com características clínicas basais o mais semelhante possível, com uma proporção de 1:1. Aplicamos um modelo de regressão logística. Constatou-se que diversas variáveis estiveram significativamente associadas à probabilidade de pertencer a um dos grupos, com base na metodologia de eliminação backward stepwise (ponto de corte p = 0,05). As seguintes variáveis foram usadas para calcular o escore de propensão para cada paciente: idade e nível de cuidado na data índice, uso anterior de anticoagulantes, uso de fármacos antianginosos, uso de insulina, acidente vascular cerebral, custos de hospitalização no período basal. Os pacientes foram pareados na base de 1:1 dentro dos grupos etários de 5 anos específicos para o sexo, com base no escore de propensão com uma diferença máxima permitida de 0,001.

A análise estatística adotada posteriormente foi a construção de um modelo de regressão de risco proporcional de Cox. Escolheu um endpoint composto que incluiu morte por todas as causas, acidente vascular cerebral/ataque isquêmico transitório, hospitalizações e sangramentos maiores. As variáveis de exposição levadas em consideração foram: terapia com edoxabana de baixa dosagem, terapia com enoxaparina, hipertensão, diâmetro anteroposterior do átrio esquerdo > 40 mm, fração de ejeção do ventrículo esquerdo < 40%, idade > 85 anos, cirrose hepática como causa de trombocitopenia, doença de Werlhof como causa de trombocitopenia. Em todas as análises estatísticas, o valor p < 0,05 foi considerado estatisticamente significante.

Os cálculos foram feitos usando o Excel 2016 (versão 16.0, Seattle, WA, EUA), além de MedCalc versão 18.6 (Acacialaan 22, 8400 Ostend, Bélgica) e Epi-Info versão 7.1.5.0 para Windows (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, Geórgia — EUA). O aumento do risco de ser afetado pelo endpoint composto mostrou-se associado à exposição à terapia com enoxaparina (hazard ratio (HR): 3,31; IC 95%: 1,54 a 7,13; p = 0,0023) e cirrose hepática como causadora de trombocitopenia (HR: 1,04; IC 95%: 1,002 a 1,089; p = 0,0410). Até mesmo a hipertensão esteve associada a risco elevado (HR: 1,104; IC 95%: 1,011 a 1,966; p = 0,0477). Por outro lado, a terapia com edoxabana esteve significativamente associada à diminuição do risco de endpoint primário (HR: 0,071; IC 95%: 0,013 a 0,373; p = 0,0019).

A heparina é uma causa não desprezível de trombocitopenia. Esse fato parece se aplicar também à heparina fracionada de baixo peso molecular, ou seja, enoxaparina sódica, a julgar pelos resultados encontrados, que desaconselham o uso da terapia com enoxaparina em pacientes com trombocitopenia documentada. Além disso, a iminente progressão da cirrose hepática pode ter contribuído para causar um risco significativamente maior do endpoint composto. De fato, é provável que os sangramentos maiores devidos à ruptura de varizes gastroesofágicas tenham desempenhado um papel substancial na determinação da inferência conclusiva de que o composto é desfavoravelmente influenciado pela cirrose hepática como variável de exposição. Por outro lado, a terapia com edoxabana em doses baixas em pacientes trombocitopênicos mostrou-se protetora contra o composto de morte por todas as causas, acidente vascular cerebral/ataques isquêmicos transitórios, hospitalizações e sangramentos maiores. A principal limitação do estudo é sua natureza retrospectiva, que não permite tirar conclusões definitivas sobre a comparação entre enoxaparina e edoxabana, devido à possibilidade de confusão por indicação, apesar do fato de a técnica de escore de propensão de pareamento ter sido adotada como contramedida. No entanto, com base em nossa análise retrospectiva, o edoxabana em doses baixas seria uma ferramenta farmacológica eficaz e segura para a profilaxia de eventos cardioembólicos em pacientes com FA e trombocitopenia.

Footnotes

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Referências

  • 1.1. Casu G, Gulizia MM, Molon G, Mazzone P, Audo A, Casolo G, et al.[ANMCO/AIAC/SICIGISE/SIC/SICCH Consensus document: Percutaneous left atrial appendage occlusion in patients with nonvalvular atrial fibrillation: indications, patient selection, competences, organization, and operator training]. G Ital Cardiol (Rome). 2016 Jul-Aug;17(7-8):594-613. [DOI] [PubMed]
  • 2.2. Kirchhof P, Benussi S, Kotecha D, Ahlsson A, Atar D, Casadei B, et al.; ESC Scientific Document Group. 2016 ESC Guidelines for the management of atrial fibrillation developed in collaboration with EACTS. Eur Heart J. 2016 Oct 7;37(38):2893-962. [DOI] [PubMed]
  • 3.3. Goette A, Merino JL, Ezekowitz MD, Zamoryakhin D, Melino M, Jin J, et al; ENSURE-AF investigators. Edoxaban versus enoxaparin-warfarin in patients undergoing cardioversion of atrial fibrillation (ENSURE-AF): a randomised, open-label, phase 3b trial. Lancet. 2016 Oct 22;388(10055):1995-2003. [DOI] [PubMed]
  • 4.4. Poulakos M, Walker JN, Baig U, David T. Edoxaban: A direct oral anticoagulant. Am J Health Syst Pharm. 2017 Feb 1;74(3):117-29. [DOI] [PubMed]
  • 5.5. Grotta A, Bellocco R. A review of propensity score: principles, methods and application in Stata. Italian Stata Users Group Meeting - Milan, 13 November 2014.p.24-45.
Arq Bras Cardiol. 2020 Oct 13;115(4):717–718. [Article in English]

Thrombocytopenia-Related Problems in Patients with Concomitant Atrial Fibrillation Requiring Antithrombotic Prevention: A Retrospective Cohort Study

Renato De Vecchis 1,, Andrea Paccone 2, Silvia Soreca 1

Abstract

Low-dose edoxaban and enoxaparin sodium have been the subject of a retrospective comparison implemented with the propensity score technique in order to mitigate the effects of the differences in the basal clinical features of two cohorts and minimize the risk of bias.

Subsequently, using a Cox proportional-hazards model, the association of each type of therapy with the risk of the composite of all-cause death, stroke/transient ischemic attack, hospitalizations and major bleeding events was assessed. For this analysis, a p-value < 0.05 was considered statistically significant. Therapy with enoxaparin and liver cirrhosis as causing thrombocytopenia were associated with increased risk of the composite endpoint (enoxaparin: hazard ratio (HR): 3.31; 95% CI: 1.54 to 7.13; p = 0.0023; liver cirrhosis, HR: 1.04; 95% CI: 1.002 to 1.089; p = 0.0410). Conversely, edoxaban therapy was significantly associated with decreased risk of the composite endpoint (HR: 0.071; 95% CI: 0.013 to 0.373; p = 0.0019). Based on this retrospective analysis, edoxaban at low doses would appear as an effective and safe pharmacological tool for the prophylaxis of cardioembolic events in patients with AF and thrombocytopenia.

Keywords: Cohort Studies, Thrombocytopenia, Atrial Fibrillation, Anticoagulants, Edoxaban, Enoxaparine, Hemorrhage, Stroke, Liver Cirrhosis, Heparin/therapeutic use

Introduction

A common problem is the presence of atrial fibrillation (AF) in patients suffering from thrombocytopenia, which obviously contraindicates the administration of full-dose anticoagulant drugs.1 Moreover, in these cases, the implementation of an AF ablation program involves non-negligible risk, because the first three months following ablation, the so-called “blanking period,” coincide with the need to administer, given the high risk of AF relapses, not only antiarrhythmics, but also anticoagulants at full doses.2 Instead, the administration of fractionated low-molecular-weight heparin, namely enoxaparin sodium3 at a dose of 4000 I.U. per day, appeared to be a viable option. Alternatively, a widely practiced therapeutic approach was the non-vitamin K antagonist edoxaban4 at the prefixed dose of 30 mg per day.

In the present retrospective cohort study, which encompassed a median period of 40 months (interquartile range: from 36 to 48 months), 220 patients were included according to an arbitrary criterion, namely without doing power and sample size calculations. The patients subjected to edoxaban were 90 altogether, whereas 130 patients were assigned to enoxaparin.

The requirements for inclusion in the retrospective study were: moderate thrombocytopenia, defined by a platelet concentration between 99,000 and 30,000 thrombocytes per mm3; chronic AF, subject to the rate control strategy; absence of newly diagnosed paroxysmal AF.

Recruitment of cases was based on the constitution of homogeneous groups according to the “propensity score matching” method5 to decrease the risk of bias ensuing from the differences in the basal clinical features of the two groups. Patients on unfractionated heparin were paired to patients on a low dose (30 mg per day) of edoxaban with basal clinical features as similar as possible, with a 1:1 ratio. We applied a logistic regression model. Several variables were found to be significantly associated with the probability of belonging to one of the groups, based on a backward stepwise elimination (p = 0.05 cut-off) methodology. The following variables were finally used to calculate the propensity score for each patient: age and care level at index date, previous anticoagulant use, antianginal drug use, insulin use, stroke, hospitalization costs in the baseline period. Patients were matched 1:1 within gender-specific 5-year age groups, based on their propensity score with a maximum allowable difference of 0.001.

The statistical analysis subsequently adopted was the construction of a Cox proportional-hazards regression model. A composite endpoint was chosen including all-cause death, stroke/transient ischemic attack, hospitalizations and major bleeding events. The exposure variables taken into account were low-dose edoxaban therapy, enoxaparin therapy, hypertension, left atrium anteroposterior diameter > 40 mm, left ventricular ejection fraction < 40%, age > 85 years, liver cirrhosis as a cause of thrombocytopenia, Werlhof’s disease as a cause of thrombocytopenia. In all statistical analyses, p value < 0.05 was considered to be statistically significant.

The calculations were made using Excel 2016 (version 16.0, Seattle, WA, USA) as well as MedCalc Version 18.6 (Acacialaan 22, 8400 Ostend, Belgium) and Epi-Info version 7.1.5.0 for Windows (Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, Georgia — USA). Increased risk of being affected by the composite endpoint was associated with exposure to the therapy with enoxaparin (hazard ratio (HR): 3.31; 95% CI: 1.54 to 7.13; p = 0.0023) and liver cirrhosis as causing thrombocytopenia (HR: 1.04; 95% CI: 1.002 to 1.089; p = 0.0410). Even hypertension was associated with increased risk (HR: 1.104; 95% CI: 1.011 to 1.966; p = 0.0477). Conversely, edoxaban therapy was significantly associated with decreased risk of the primary endpoint (HR: 0.071; 95% CI: 0.013 to 0.373; p = 0.0019).

Heparin is a non-negligible cause of thrombocytopenia. This seems to apply also to low-molecular-weight fractioned heparin, i.e., enoxaparin sodium, judging by the results we have found, which advise against the use of enoxaparin therapy in patients with documented thrombocytopenia. Furthermore, the ominous progression of liver cirrhosis might have played a role in causing a significantly higher risk of the composite endpoint. Indeed, the bleeding events due to the rupture of gastroesophageal varices are likely to have played a substantial role in determining the conclusive inference that the composite is unfavorably influenced by liver cirrhosis as an exposure variable. Vice versa, edoxaban therapy at low doses in thrombocytopenic patients has proved to be protective against the composite of all cause-death, stroke/transient ischemic attacks, hospitalizations and major bleeding events. The main limitation of the study is its retrospective nature, which does not allow to draw definitive conclusions about the comparison between enoxaparin and edoxaban due to the possibility of confounding by indication despite the fact that the propensity score matching technique has been adopted as a countermeasure. However, based on our retrospective analysis, edoxaban at low doses would appear as an effective and safe pharmacological tool for the prophylaxis of cardio-embolic events in patients with AF and thrombocytopenia.

Footnotes

Sources of Funding

There were no external funding sources for this study.

Study Association

This study is not associated with any thesis or dissertation work.


Articles from Arquivos Brasileiros de Cardiologia are provided here courtesy of Sociedade Brasileira de Cardiologia

RESOURCES