Introdução
A endocardite infecciosa (EI) é uma doença grave, com mortalidade intra-hospitalar média de 20%.1 - 3 Apresenta incidência crescente, com destaque para o aumento de sua prevalência na população idosa.4 - 9 Em pacientes da terceira idade com EI, existem diferenças quanto a apresentação clínica, complicações, presença de comorbidades, abordagem terapêutica e mortalidade.4 , 10 - 13 Diretrizes de EI não abordam especificamente idosos e não está claro até que ponto elas podem ser utilizadas de maneira adequada nesses pacientes.2 , 14 , 15 A população idosa claramente beneficiou-se do progresso médico, com técnicas diagnóstico-terapêuticas que influenciam no aumento da expectativa de vida e em procedimentos menos invasivos.10 Um exemplo é o implante de válvula aórtica transcateter na abordagem de doenças da valva aórtica.15 No entanto, esses procedimentos, em conjunto com o implante crescente de dispositivos eletrônicos cardiovasculares (DEC), contribuem para infecções como a EI. Encontram-se comorbidades em mais da metade de idosos, com consequente necessidade de cuidados prolongados de profissionais da saúde, o que aumenta a probabilidade de aquisição da EI.3 , 16 O diagnóstico de EI em idosos, frequentemente, é atrasado ou esquecido.3 As manifestações podem ser inespecíficas, atribuídas ao envelhecimento e outras condições. A febre pode estar ausente, havendo apenas confusão mental.17 A EI pode se apresentar com complicações semelhantes a outras condições, como insuficiência cardíaca (IC), acidente vascular encefálico (AVE) ou embolia sistêmica atribuível a fibrilação atrial.3 , 16 No Brasil, apesar de uma população idosa crescente, até o momento não foi publicado nenhum artigo publicado a respeito de EI para esse grupo. O objetivo deste estudo é descrever o grupo de idosos em nossa coorte de EI em adultos e compará-los aos não idosos, ressaltando as diferenças entre os grupos.
Métodos
O local do estudo é um hospital público terciário especializado em cardiologia de alta complexidade, com cirurgia cardíaca in loco . O estudo é retrospectivo de pacientes idosos definidos como pelo Estatuto do Idoso do Brasil,18 identificados na coorte de pacientes adultos com critério de EI definitiva pelos critérios modificados de Duke e conduzido pelo período de janeiro de 2006 a dezembro de 2019. As variáveis do estudo foram as incluídas em ficha de coleta de dados padrão ( case report form ) descritas previamente.4 A análise estatística foi realizada utilizando-se o programa Jamovi®, versão 1.2.2. Os dados foram expressos como frequências, médias ± desvio-padrão da média, mediana e intervalo interquartil. Para a análise bivariada, foram usados os testes do Qui-quadrado e Exato de Fisher. Para verificar a normalidade da distribuição, utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk. Os testes t de Student não pareado e o de Mann-Whitney foram utilizados para comparar as variáveis numéricas entre os grupos de interesse. O valor de p < 0,05 foi considerado estatisticamente significante.
Resultados
Idosos corresponderam a 97 de 370 casos de EI (26,2%) no período. A idade média foi 68,8±6,3 anos; sexo masculino correspondeu a 73 casos (75,2%). A apresentação foi aguda, isto é, sinais e sintomas foram observados em menos de 1 mês de evolução, em 60% dos casos (57/95) e subaguda em 40% (38/95). A aquisição foi comunitária em 49 (50,5%), nosocomial em 37 (38,1%) e relacionada a saúde não nosocomial em 11 (11,3%). Microrganismos mais prevalentes foram enterococos 18 (25,7%). Entre 12 S. aureus isolados, 10 (83,3%) eram MRSA e, desses, 6 eram hospitalares e 4 comunitários. Hemoculturas foram negativas em 27,8% ( Figura 1 ). Ecocardiograma transesofágico foi positivo em 88/96 (91,6%), e transtorácico em 75/96 (78,1%). Achados mais encontrados foram insuficiência aórtica em 37/96 (38,5%) e mitral em 43/96 (44,7%); vegetações aórticas em 40/96 (41,6%), mitrais em 36/96 (37,5%), tricúspides em 9/96 (9,3%), e em DEC em 11/96 (11,4%). As comorbidades mais frequentes foram hipertensão arterial, insuficiência cardíaca (IC) e doença arterial coronariana ( Figura 2 ); cirurgia cardíaca (CC) prévia foi relatada em 50/97 (51,5%). Havia predisposição de valva nativa em 36/92 (39,1%), prótese valvar em 45/97 (46,4%) e EI prévia em 10/97 (10,7%). As complicações foram IC por insuficiência aórtica ou mitral 57/97 (58,7%), abscesso 24/97 (24,7%), deiscência paravalvar protética 7/45 (15,5%), e perfuração valvar 25/97 (25,7%). Fenômenos embólicos esplênicos ocorreram em 28/97 (28,8%) e cerebrais em 18/97 (18,5%).
Dos 80 idosos com indicação cirúrgica (82,4%), 59 (73,7%) foram operados. A mortalidade hospitalar foi de 38 (39,1%); 22/59 (37%) morreram entre os que foram abordados cirurgicamente e 16/38 (42%) entre os que não foram.
Realizou-se uma análise comparativa utilizando dados de 359 pacientes adultos com EI de janeiro de 2006 a setembro de 2019 ( Tabela 1 ). Um total de 266 pacientes tinha idade < 60 anos, enquanto 93 pacientes (25,9%) tinha ≥ 60 anos. A proporção de homens entre idosos foi maior, assim como a evolução aguda e a EI hospitalar.
Tabela 1. – Comparação de características clínicas e laboratoriais, e desfechos entre idosos e não idosos com EI, realizada entre janeiro de 2006 e setembro de 2019.
Variável/proporção em percentual (%) | Idosos(n=93) | Não idosos (n=266) | p valor |
---|---|---|---|
Gênero masculino | 72 | 60,2 | p = 0,04 |
Evolução aguda | 63,3 | 46,8 | p = 0,019 |
Aquisição hospitalar | 39,8 | 24,5 | p = 0,005 |
Aquisição relacionada a assistência à saúde não hospitalar | 10,8 | 7,2 | p = 0,285 |
Febre | 88,2 | 94,7 | p = 0,034 |
Sopro regurgitante novo | 48,8 | 60,4 | p = 0,064 |
Eventos embólicos | 35,2 | 56,9 | P < 0,001 |
Eventos embólicos para SNC | 17,2 | 29,1 | p = 0,025 |
Esplenomegalia | 10,5 | 26,5 | p = 0,002 |
Enterococos | 20,4 | 7,5 | p < 0,001 |
Estreptococos do grupo viridans | 16 | 26 | p = 0,047 |
Staphylococcus aureus | 12,9 | 10,5 | p = 0,531 |
Valvopatia reumática | 20,2 | 37,7 | 0,002 |
Cardiopatia congênita | 1,1 | 18 | < 0,001 |
Prótese valvar* | 25,7 | 11,8 | 0,006 |
HAS | 72,9 | 39,2 | < 0,001 |
DM | 16,1 | 10,2 | 0,123 |
Dislipidemia | 35,0 | 14,8 | < 0,001 |
Fibrilação atrial | 26,1 | 13,2 | 0,004 |
IC pregressa | 53,3 | 35,7 | 0,003 |
DPOC | 10,9 | 2,7 | 0,002 |
DAC | 31,5 | 6,1 | < 0,001 |
DCV | 10,8 | 4,9 | 0,047 |
MP | 20,4 | 8,3 | 0,002 |
IRC | 27,5 | 17,7 | 0,044 |
Hemodiálise | 7,5 | 7,1 | 0,902 |
Neoplasia | 12,9 | 3,9 | 0,002 |
CC anterior | 52,7 | 32,2 | < 0,001 |
ICP | 10,9 | 3,4 | 0,006 |
RVM | 16,2 | 2,3 | < 0,001 |
Uso de AAS | 24,4 | 5,9 | < 0,001 |
Uso de varfarina | 24,4 | 18,1 | 0,222 |
Indicação cirúrgica para EI | 81,7 | 88,7 | p = 0,085 |
Ventilação mecânica** | 30,3 | 18 | p = 0,015 |
Uso de inotrópico** | 33,7 | 21,8 | p =0,028 |
Óbito intra-hospitalar | 43,0 | 18,1 | < 0,001 |
SNC: sistema nervoso central; HAS: hipertensão arterial sistêmica; DM: diabetes melito; IC: insuficiência cardíaca; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; DAC: doença arterial coronariana; DCA: doença cerebrovascular; MP: marcapasso; IRC: insuficiência renal crônica; CC: cirurgia cardíaca; ICP: intervenções cardíacas percutâneas; RVM: revascularização do miocárdio; AAS: ácido acetilsalicílico; * prótese valvar com mais de 1 ano de inserção; ** no pré-operatório de troca valvar para EI.
Quanto à clínica, pacientes idosos tiveram menos febre, sopro regurgitante novo, eventos embólicos, incluindo eventos para o sistema nervoso central, e menos esplenomegalia. Quanto a etiologia, idosos apresentaram enterococos com maior frequência, a estreptococos do grupo viridans em menor e frequência de S. aureus semelhante.
Idosos tiveram maior necessidade de ventilação mecânica e de inotrópicos antes da cirurgia. Não houve diferença quanto a insuficiência renal aguda, distúrbios de condução, embolização recorrente e abscessos. Não houve diferença na proporção de indicação cirúrgica entre idosos e NI. Idosos tiveram indicação cirúrgica em 81,7%, e foram operados em 66,3%; em comparação, dos 88,7% dos pacientes NI para os quais a cirurgia foi indicada, 84% foram operados. A indicação foi insuficiência ventricular secundária a regurgitação mitral ou aórtica aguda em 56,5% de idosos versus 63,4% de NI (p=0,243). Outras indicações cirúrgicas foram abscesso miocárdico/paravalvar em 21,5% de idosos versus 20% de NI (p=0,757); deiscência de prótese (6,5% versus 4,3%, respectivamente, p=0,409) e bacteremia persistente em 9% versus 4% de NI (p=0,062). A mortalidade foi mais que duas vezes maior em pacientes idosos ( Tabela 1 ).
Discussão
Este estudo é inédito no Brasil, por ter enfoque na EI em idosos. Mais de um quarto dos pacientes com EI em nossa coorte de adultos eram idosos. Em estudos de países desenvolvidos, nota-se aumento da proporção de idosos entre casos de EI.4 - 9
Verificou-se frequência menor de febre, novo sopro regurgitante e complicações embólicas entre os idosos, o que foi constatado em outras publicações,4 , 12 esta última relacionada ao uso de antiagregantes plaquetários e/ou anticoagulantes. Tal situação pode indicar proteção para embolização com uso desses medicamentos; porém, são necessárias mais evidências científicas para comprovar essa hipótese. No estudo, idosos usaram significativamente mais ácido acetilsalicílico, e não varfarina, quando comparados aos NI.
Comorbidades foram mais prevalentes entre idosos, como esperado; tal fator é semelhante em estudo multicêntrico com grande número de pacientes, em que as frequências entre idosos e não idosos, respectivamente, de DM de 22,9% x 11,9% ( p < 0,001), de câncer geniturinário, de 4,7% x 0,6% ( p < 0,001) e de câncer do trato gastrintestinal de 3,2% x 0,8% (p < 0,001).4 Procedimentos invasivos prévios anteriores também foram mais frequentes entre idosos em nosso estudo, como foi nessa mesma publicação (56,2% x 38,5%, p < 0,001).4 Ratifica-se que a população idosa continua sendo mais exposta a procedimentos diagnósticos/terapêuticos, havendo maior predisposição à EI em função de eventos de bacteremia ocorridos nestes cenários e a presença de material sintético/dispositivos.
Observou-se maior frequência de EI hospitalar entre nossos idosos (39,8%); proporção semelhante é notada na literatura, em que a aquisição nosocomial representa 10,2% a 37% dos casos de EI em idosos.6 , 11 , 12 , 19 Na Tabela 2 , estão listados os estudos considerados mais relevantes de EI em idosos.
Tabela 2. – Aspectos da endocardite em idosos em uma revisão da literatura, 2000-2020.
Autor | País | No do estudo | Período | Idade/ sexo | Valvas acometidas | Microrganismos mais frequentes | Condições subjacentes | Complicações | % Cirurgia | Mortalidade |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Durante-Mangoni, 20084 | Vários | 2.759 | 2000- 2005 | 1.056 idosos (65 anos ou mais); fem: (35,8%) | M (50%); Ao (41%); Tri (7%); dispositivos intracardíacos (10%); próteses (26%) | S. aureus (28,3%) (MRSA 35,8%); grupo bovis (8,3%); enterococos (16,5%); ECN (14%); estreptococos do grupo viridans (14,2%) | RM (63%); EA (28%); procedimento invasivo (56,2%); DM (22,9%); CA geniturinário (4,7%); GI (3,2%) | ICC (33,1%); AVE (14,6%); Embolia sistêmica (15,3%); Abscesso (14%); Bacteremia persistente (9,2%) | 38,9% | 24,9% |
Remadi, 200917 | França | 348 | 1991-2006 | 75 idosos (75 anos ou mais); masc: 47; fem: 28 | M: 45,3%; Ao: 54,7%; M-Ao: 16%; EI lado direito: 16%; prótese valvar (28%); marcapasso (26,7%) | Estreptococos (37,4%); estafilococos (36 %); ECN (27,8%) em pacientes operados | DM 2 (25.3%); DRC (17,3%); neoplasia (26,7%) | ICC (28%); embolia 18,7%; evento maior de SNC 9,3%; Hemorragia Intracerebral 1,3% Abscessos 18,7% | 29,3% | Geral: 16% Cirúrgica: 9%; |
López, 201019 | Espanha | 600 EI esquerda | 1996-2008 | Q3 (64-72 anos): 152; Q4 (>72 anos): 148 | Nosocomial: 33%-37%; Prótese: 47%- 42%; prótese precoce: 36%- 39%; M(nat): 51%-61%; M(mec): 54%-35%; Ao (nat): 49%-39%; Ao (mec): 35%-21%; Ao (bio): 12%-33% | ECN: 22%-18%; S. aureus: 14%-14%; MRSA: 18%-33%; enterococos:12%-13%; grupo viridans: 12%-12%; grupo bovis: 5%-7%. | Reumáticos: 11%-8%; próteses 45- 48%; degeneração 12%-21%; DM: 28%- 29%; CA: 11%-13%; cateter IV: 6%-12%; C. cardíaca prévia: 14%- 12% | ICC: 59-64%; AVE: 18- 23% ; IRA: 40- 46%; Bacteremia Persistente: 32- 37%; Embolia: 24- 28%; Sepse: 14%- 16%; Abscesso perivalvar: 25- 26%. | 54%-40% | Geral: 37%-36%; C. Urg: 44%-39%; C. Ele: 28%-34%. Trat. Med.: 40%-36% |
Ramírez-Duque 201112 | Espanha | 961 EI esquerda | 1984-2008 | 65 anos ou mais: 356; Masc: 63,3% | Nosocomial: 21,1%; valva nativa: 74,5%; prótese tardia: 13,2%; prótese precoce: 12,4%; Ao: 50%; M: 37%; M-Ao: 11,4%; | Grupo viridans: 16.9%; S. aureus: 17.4%; MRSA 12.9%; ECN: 17,1%; enterococcos: 16,3%; grupo bovis: 5.3%; BGN: 4,2% | 80%. | AVE: 26,6%; Embolia: 29,2%; IRA: 39,6%; sepse 16,5%; Complicações Intracardíacas: 27,8%; ICC: 28,9% | 36% | Geral: 43,2% |
Bassetti, 20145 | Itália | 436 | 2004-2011 | Grupo B (65-74 anos): 145; fem: 30%; grupo C (75 anos ou mais): 137; fem: 38,6% | Vegetação: 77,2%-78,1% | Enterococos: 11,7%-27%; estreptococos spp.: 33,1%-22,6%; viridans: 15,2%-7,3%; grupo bovis: 12,4%-11,2%; S. aureus: 14,5%-19,7%; ECN: 11%-13,1% | Doença valvar: 47,6%-40,2%; prótese: 40%-40,2%; ICC: 30,3%-47,7%; DRC: 22,1%-29,2%; DM2: 30,3%-23,4%; CA: 23,5%-25,6%; cardite reumática: 7,6%-2,9% | Embolia: 22,1%-13,9% Sinal neurológico focal: 11%-9,5%; Abscesso: 15,9%-14,6% | 37,9%- 22,6% | Geral: 19,3%-22,6%. |
Oliver, 20176 | França | 454 | 2008-2013 | G2 (65-80 anos): 173; Masc: 71,7%; G3 (acima de 80 anos): 51; Masc: 64,7% | Hosp.: 19,9%-23,5%; Pós-op..: 11%-11,8%; Valva nativa: 57,8%-58,8%; Ao G2: 42%; M G3: 43,1%; valva protética: 42,2%-41,2%; EI aguda: 57,1%-68,8%; EI > 3 meses: 14,3%-6,3%; principais portas de entrada (G3): TGI: 33,3%; TGU: 7,8%; pele (23,6%) | Enterococos: 15,6%-21,6%; Grupo bovis: 16,2% -17,7%; viridans: 17,9%-15,7%; ECN 9,3%-5,9%; MSSA: 12,7%-11,8%; MRSA: 2,9%- 2% | EI prévia: 11%-11,8%; DM2: 19,1%-25,5%; HAS: 49,1%-58,8%; DAC: 17,8%-17%; AVE: 9,3%-7,8%; DRC: 14,5%-27,5%; CA: 24,3%-29,4% | Embolia em ATB: G3: 21,6%; IRA: G3:51%; Espondilite: 12,6%-23,5% Abscesso: 26.5%-29,4% | 69,6%-42,1% | Intrahospitalar: 13,3%-15,7%; Em 1 ano: 19,7%-37,3%; Cirúrgica: G3: 6,3% |
Wu, 201911 | China | 405 | 2007-2016 | G3 (65 anos ou mais): 59; masc: 69,5% | Nativa: 83,1%; mitral: 25,4%; Ao: 30,5%; valvas à D: 6,8%; próteses: 13,6% marcapasso: 3,4%; comunitária: 79,7%; nosocomial: 10,2% | Estreptococos: 22%; viridans: 5,1%; estafilococos: 18,5%; S. aureus: 3,4%; ECN: 15,3%; enterococos: 1,7% | Reumáticos: 18,6%; cirurgia cardíaca prévia: 23,7%; degenerativa: 10,2%; DPOC: 3,4%; CA: 3,4%; HD: 6,8%; HAS: 42,4%; DM: 16,9%; Má higiene oral: 49,2%. | ICC: 62,7%; Embolia: 39%; IRA: 30,5%; AVE: 23,7%; Arritmia: 39% FA: 33,9%; Abscesso: 13,6%; | Indicação: 96,6% Cirurgia: 40,7% | Intra-hospitalar: 20,3% |
Chun-Yu Lin, 202020 | Taiwan | 179 EI esquerda | 2005-2015 | 65 anos ou mais: 38; fem: 36,8%; média de idade: 74.2±6.4 | Ao: 50% Troca por: Ao bio: 100%; Ao mec: 0%; M: 36,8 Troca por: M bio: 100%; M mec: 0% | Estreptococos: 28,9%; Viridans: 13,2%; Enterococos: 10,5%; S. aureus: 7,9%. | HAS: 13,2%; DM: 28,9%; DRC: 10,5% | VM: 23,7%; Inotrópicos: 10,5%; Embolia: 23,7%; IRA: 5,3%; FA: 13,2%; ICC: 18,4%; Abscesso: 2,6% | Todos os pacientes realizaram cirurgia, visto que o estudo avalia os pacientes submetidos à mesma | Intra-hospitalar: 26,3% |
Fem: feminino; masc: masculino; M: mitral; Ao: aórtica; Tri: tricúspide; MRSA: Meticilin Resistant Staphylococcus aureus; ECN: estafilococos coagulase negativo; RM: revascularização miocárdica; EA: estenose aórtica; DM: diabetes melito; CA: câncer; GI: gastrintestinal; ICC: insuficiência cardíaca congestiva; AVE: acidente vascular encefálico; EI: endocardite infecciosa; DRC: doença renal crônica; SNC: sistema nervoso central; (mec): mecânica; (nat): nativa; bio: biológica; IRA: injúria renal aguda; C. Urg: cirurgia de urgência; C. Ele: cirurgia eletiva; Trat. med.: tratamento medicamentoso; BGN: bacilos gram-negativos; P. valv.: procedimento valvar; hosp.: hospitalar; pós-op.: pós-operatória; TGU: trato geniturinário; HAS: hipertensão arterial sistêmica; DAC: doença arterial coronariana; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; VM: ventilação mecânica; FA: fibrilação atrial.
Microrganismos mais prevalentes e observados em nossa série foram enterococos (25,7%), estreptococos do grupo viridans (17,1%) e S. aureus (17,1%). Ainda que estreptococos orais tenham sido anteriormente responsáveis pela maioria dos casos de EI em idosos, estafilococos predominam nas últimas décadas, especialmente S. aureus .8 , 9 Enterococos também estão relacionados a bacteremia por acessos vasculares, tendência epidemiológica que está ligada ao aumento da incidência de EI associada a cuidados de saúde.5 , 6 , 12 A frequência de EI causada por estreptococos que colonizam o trato digestivo, como Streptococcus gallolyticus e enterococos, acontece por conta da maior incidência de lesões do cólon em pacientes idosos.4 , 8 , 19 Todos os 7 pacientes com EI por grupo bovis tiveram o TGI investigado, mas não aqueles com EI por enterococos.
Em nosso centro de referencia em cirurgia cardíaca, houve indicação de troca valvar em mais de 4/5 dos idosos; porém, mais de 1/4 deles não foram operados. Tal fato possui aspecto multifatorial, incluindo idade avançada, múltiplas comorbidades, fragilidade, risco cirúrgico elevado e não aceitação de cirurgia pelo paciente ou sua família, entre outros, como observado através de estudo em EI em octogenários.6 Motivos pelos quais idosos que tiveram indicação cirúrgica não foram operados dizem respeito, sobretudo, ao status pré-operatório crítico, como observado pela elevada frequência de ventilação mecânica e uso de inotrópicos no pré-operatório. É importante notar que aneurismas micóticos e insuficiência renal aguda não foram mais frequentes entre idosos e NI, e que eventos de SNC foram menos frequentes em idosos. Em alguns estudos, a idade avançada é um preditor independente de mortalidade intra-hospitalar,4 , 12 o que influencia negativamente na decisão pelo procedimento. Contudo, em estudo recente realizado na China, notou-se que a sobrevida em 1 ano dos idosos que foram submetidos à abordagem cirúrgica foi maior do que nos indivíduos submetidos à terapêutica medicamentosa isoladamente (95,8% x 68,6%, p = 0,007).11 Além disso, mesmo entre os octogenários,6 os pacientes operados apresentam melhor sobrevida em 1 ano (93,6%) e em 3 anos (75,0%), respectivamente.
A mortalidade entre idosos em nosso estudo foi de 39,1%; na literatura, a taxa de óbitos variou de 16% a 43,2%.4 - 6 , 11 , 12 , 17 , 19 , 20 Por fim, notamos que:
Proporção expressiva (um quarto) das EI ocorreu em idosos, mesmo no sistema de saúde pública no Brasil;
Enterococos foi o patógeno mais frequente, e houve elevada proporção de MRSA entre a etiologia estafilocócica, o que sugere aquisição nosocomial ou foco gastrintestinal/geniturinário;
A clínica é menos exuberante em idosos, com menos febre, sopro novo e eventos embólicos;
A mortalidade nos idosos foi alta, o que sugere a contribuição da idade e das comorbidades, e possivelmente de diagnóstico tardio e não realização de cirurgia cardíaca.
Agradecimentos
A todos os colegas do INC que atuam nas enfermarias, unidades fechadas e centro cirúrgico por seu cuidado aos pacientes, e a nossos ecocardiografistas e radiologistas, e especialmente, a Francisca Pereira Ribeiro, do laboratório de Microbiologia, pelo suporte técnico.
Vinculação acadêmica
Este artigo é parte de trabalho de conclusão de graduação de Luiz Henrique Braga Lemos pela Unigranrio.
Aprovação ética e consentimento informado
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Nacional de Cardiologia sob o número de protocolo 080/12.09.2005 e 171/2006. Todos os procedimentos envolvidos nesse estudo estão de acordo com a Declaração de Helsinki de 1975, atualizada em 2013. O consentimento informado foi obtido de todos os participantes incluídos no estudo.
Fontes de financiamento: Dra. Cristiane Lamas recebeu auxilio à pesquisa pela Fundação Carlos Chagas de Amparo a Pesquisa do Rio de Janeiro (FAPERJ, JCNE ), Luiz Henrique Braga Lemos bolsa de Iniciação Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento e Pesquisa (CNPq) e Leonardo Ribeiro da Silva bolsa deIniciação Científica do Santander.
Referências
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- 2.Baddour LM, Wilson WR, Bayer AS, Fowler VG Jr, Tleyjeh IM, Rybak MJ, et al. Infective Endocarditis in Adults: Diagnosis, Antimicrobial Therapy, and Management of Complications: A Scientific Statement for Healthcare Professionals from the American Heart Association. Circulation. 2015;132(15):1435-86. doi: 10.1161/CIR.0000000000000296. [DOI] [PubMed]
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